domingo, 28 de agosto de 2011

O ERRO DE DESCARTES segundo DAMÁSIO - II orelhas

LIVRO: "O ERRO DE DESCARTES - EMOÇÃO, RAZÃO E O CÉREBRO HUMANO" (1994)
DE: António R. Damásio
ED: Companhia das Letras (Brasil, São Paulo: 1996, 330 págs., 2a. edição)
Título original: Descartes' error - Emotion, reason and the human brain
Tradução do português de Portugal: Dora Vicente e Georgina Segurado
Revisão da edição portuguesa: Antônio Branco
Capa: Ettore Bottini
Preparação: Pedro Maia Soares e Cecília Ramos
Revisão: Carmen S. da Costa e Ana Maria Barbosa
Palavras-chave: biologia, cérebro, emoção, fisiologia, mente, neuropsicologia, psicologia, razão

ORELHAS
Penso, logo existo. Esta afirmação, talvez a mais famosa da história da filosofia, ilustra exatamente o oposto do que o autor deste livro propõe e desenvolve em suas páginas. A frase de Descartes sugere que pensar e ter consciência de pensar definem o ser humano. E como sabemos que o filósofo francês concebia o ato de pensar como uma atividade separada do corpo, sua definição estabelece um abismo entre mente e corpo. Para contestar Descartes - e todas as consequências dualistas de sua afirmação - António Damásio não recorre a filigranas escolásticas ou sutilezas metafísicas, mas ao seu conhecimento de pacientes neurológicos afetados por danos cerebrais.
Escrito com clareza e graça, O Erro de Descartes é uma viagem fascinante ao interior de nosso cérebro que começa na metade do século XIX com a história de Phineas Gage, o capataz da construção civil que sofreu, segundo um jornal da época, um "acidente maravilhoso": seu cérebro foi trespassado por uma barra de ferro de um metro de comprimento e três centímetros de diâmetro e ele não morreu. Mas as posteriores mudanças de comportamento e suas consequências desastrosas para a vida prática de Gage e de outros pacientes que sofreram danos semelhantes abrem as portas para a investigação de um campo quase inexplorado pela ciência: as relações entre razão e sentimento, emoções e comportamento social. Na visão inovadora de Damásio, sentimentos e emoções são uma percepção direta de nossos estados corporais e constituem um elo essencial entre o corpo e a consciência. Em suma, uma pessoa incapaz de sentir pode até ter o conhecimento racional de alguma coisa, mas será incapaz de tomar decisões com base nessa racionalidade.
Ao tirar o espírito de seu pedestal e colocá-lo dentro de um organismo que possui cérebro e corpo totalmente integrados, o autor sublinha a complexidade, a finitude e a singularidade que caracterizam o ser humano [e, por extensão bioevolutiva, todos os seres que possuem cérebro]. Reconhecer a origem humilde e a vulnerabilidade do espírito e, ao mesmo tempo, continuar a recorrer à sua orientação é tarefa difícil, mas indispensável. O ponto de partida da ciência e da filosofia deve ser anticartesiano: existo (e sinto), logo penso.

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